Caravançarai

‎"Caravançarai é o nome dado ao local onde as caravanas que atravessam o deserto param para se alojar temporariamente. É aonde pessoas de várias tribos encontram-se e contam-se histórias. É quando a vida se assenta e reduz-se ao essencial".




Quem viaja tem sempre histórias para contar. E as histórias tem sido um importante material de transmissão de conhecimento através dos tempos. 


Então vamos aprender, curtir e contar histórias em nossas viagens, de nossas viagens... de nossas vidas.


Se você tem boas histórias pra contar envie-nos para publicarmos aqui: viajelivre@gmail.com 







Alguém perguntou a um índio de 101 anos, um Xamã, um pagé americano: 
- “O que você faz?” - Ele disse:
- “Eu ensino meu povo.”
- “O que você ensina?”
- “Quatro coisas”, ele respondeu.
- “primeiro, a escutar;
- segundo: que tudo está ligado com tudo;
- terceiro: que tudo está em transformação;
- quarto: que a terra não é nossa, nós é quem somos da terra.”





Contador de Histórias:


Os Contadores de História  da América Nativa são os Guardiães de nossa história e de nossas Sagradas Tradições. Cabe a eles conservar vivos os nossos antigos conhecimentos para assegurar a futura  expansão que nossos filhos trarão à Terra. Os Contadores de História viajam entre os grupos e as Tribos das diversas Nações, levando as notícias dos acontecimentos que afetavam a todos os Nativos. O Contador de Histórias costumava contar os fatos que aconteciam em outros acampamentos, ao redor da fogueira comunitária, depois do jantar. O Contador de Histórias falava de atos heróicos, da Contagem de Golpes sobre o inimigo, de um Sonho de Cura que profetizasse  futuros acontecimentos, de Histórias de Sabedoria que conservavam viva a Tradição ou, ainda, trazia as últimas notícias acerca dos acontecimentos e das mortes nas Tribos.

Os Índios das Planícies costumavam chamar seus Contadores de Histórias de Cabelos Trançados. Esses Contadores de Histórias usavam uma pequena mecha com tranças e nós, que lhes caía pelo meio da testa e que os caracterizava como professores e historiadores da Tribo. Um Cabelo Trançado do sexo masculino não precisava participar das batalhas, mas deveria observar tudo e recordar-se mais tarde, passo a passo, do desenrolar da luta. Já um Cabelo Trançado do sexo feminino era a historiadora que mantinha viva a tradição feminina e que deveria ensinar as mulheres mais jovens a sentir orgulho de seus respectivos papéis dentro da Tribo.

Os Contadores de Histórias de todas as Tribos e Nações constroem uma ponte entre os ensinamentos tradicionais e o momento presente. As crianças de todas as gerações aprendem as lições tradicionais que os Contadores de Histórias ensinam e aplicam  estas Histórias de Sabedoria às suas próprias vidas. Também os pais e avós costumavam contar as Histórias de Sabedoria para as suas crianças, todas as noites, na hora de colocá-las debaixo dos mantos de Búfalos para dormir. Mas isso não produzia o mesmo efeito que a chegada do Contador de Histórias da Nação, que visitava as Tribos regularmente para contar as suas histórias às crianças.

As Histórias de Sabedoria costumavam ser contadas e recontadas ano após ano para que os Ensinamentos do Povo permaneçam vivos. cada história possui diversos significados e relaciona-se de formas diferentes à vida de cada pessoa. A cada vez que uma história é repetida, cresce o nível de entendimento, de acordo com o amadurecimento das pessoas que estão escutando. Os mesmos acontecimentos dentro de uma história também podem ser repetidos inúmeras vezes, de maneira diferente, para que cada ouvinte possa perceber de que modo aquela história se adapta melhor ao seu próprio momento.

O modo de pensar do Povo Vermelho difere bastante do modo de pensar dos outros povos. Nós não costumamos revelar qual é a verdadeira mensagem contida em nossas Histórias de Sabedoria. Preferimos deixar que as pessoas utilizem os seus dons individuais de intuição e observação para perceber o significado real dessas histórias. Assim, os ensinamentos da Raça Vermelha são transmitidos de forma que cada um possa aprender conforme o seu próprio ritmo e seu próprio modo de ser, dando liberdade a que cada pessoa aplique ou não estes ensinamentos à sua vida.

Os Contadores de Histórias aprendiam a respeitar a liberdade de pensamento de todos aqueles que iam em busca de sua Sabedoria. Desta maneira as crianças aprendiam a valorizar a própria inteligência e sentiam que eram membros respeitados de sua Tribo. O Contador de Histórias considerava cada criança como uma pessoa igual a ele, e colocava-se no mesmo nível dela. Se as crianças agissem de forma tola ou começassem a perturbar o grupo, eram simplesmente ignoradas, e fingia-se que elas nem mesmo estavam ali presentes. A falta de reconhecimento e de atenção logo punha fim ao mau comportamento. O Contador de Histórias conseguia passar dias seguidos fingindo que não via nem ouvia determinada criança. Esta forma de disciplina era muito mais eficiente do que o castigo corporal porque a criança se sentia envergonhada  diante das outras crianças também.

A memória ocupa um lugar especial em nossa Tradição Nativa Americana. Como as nossas histórias são transmitidas oralmente, a lembrança é cultivada como uma arte. cada uma das ervas, plantas, flores empregadas no processo de cura deve ser lembrada para as futuras gerações. Cada dança, Cerimônia, ritual, iniciação e ensinamento precisa ser guardado na memória. Todas as Leis e profecias tribais devem ser repassadas intactas para as futuras gerações. Os Golpes e as perdas precisam ser recordados para que se possam armar futuras estratégias. É claro que uma única pessoa não poderia recordar-se sozinha de todas estas coisas, ou tornar-se uma especialista em todos estes assuntos. É por isso que os diversos Clãs possuíam historiadores que guardavam a história oral de uma determinada área de conhecimento em sua memória. Estes fragmentos dos Ensinamentos Tribais eram repassados para a próxima geração e cada pessoa recordava-se de um fragmento que fazia parte dos aspectos gerais da cultura nativa.

O Contador de Histórias da Tribo tinha um posto no Conselho de Anciões. Sendo um historiador, o Contador de Histórias era convocado a contar os fatos do passado com total precisão para que estes acontecimentos ajudassem a solucionar os presentes problemas. Os Cabelos Trançados ensinavam a forma de viver de maneira equilibrada através de ações dos personagens das Histórias de Sabedoria. Uma História de Sabedoria, contada de maneira adequada, podia acabar com as discussões, mudar o curso de uma vida, insuflar novo ânimo em épocas difíceis ou ainda encorajar os jovens a assumi r novas responsabilidades na vida.

O Contador de Histórias possuía o dom de contar Histórias de Sabedoria nas quais as pessoas agiam levadas pelo medo ou ignorância, sem no entanto, referir-se a alguma pessoa em particular. Assim, os ouvintes se tornavam capazes de chegar as suas próprias conclusões. Todos os Sábios Nativos preferem ensinar por meio de histórias a apontar diretamente os defeitos de alguém. Em nossos Ensinamentos sempre nos recordam que,  quando apontamos o dedo acusando alguém, três outros dedos estarão apontando contra nós. Por outro lado, o Contador de Histórias consegue, com sua técnica, indicar delicadamente os pontos em que estamos errados, permitindo-nos corrigir nosso comportamento, sem ter que passarmos vergonha na frente dos companheiros. Esta é uma forma didática de permitir que cada pessoa decida como aplicar as histórias ouvidas em sua própria vida.

Mão Erguida era um Cabelo Trançado que vinha todos os verões partilhar o seu conhecimento com os filhos dos Ogalala reunidos para o Pow -Wow antes da Dança do Sol. Já  fazia duas gerações que os Sioux usavam o cavalo como meio de transporte. Assim, Mão Erguida chegou para o Pow -Wow cavalgando seu petiço malhado chamado Flecha Vermelha. Ao ver Mão Erguida se aproximar com seu garboso companheiro, as crianças correram até os limites do acampamento. Mão Erguida tinha duas Penas de Águia amarradas em seu cacho de escalpo, e a mecha de Cabelo Trançado lhe caía pelo meio da testa.
- Cabelo Trançado chegou! - gritavam as crianças enquanto corriam para saudá-lo. Com os olhos cheios de admiração, as crianças observavam Mão Erguida entrar no acampamento. Ele continuava sentado em Flecha Vermelha, ereto e orgulhoso, olhando sempre em frente, com seus olhos muito negros fixados no centro do acampamento. Mão Erguida era o mais velho Cabelo Trançado da Nação Sioux. Ninguém sabia quantos invernos ela já carregava nas costas. Até o Chefe, que chegou para saudá-lo, lembrava-se que Mão Erguida já era um Ancião na época em que ele ainda era uma criança.

Mão Erguida desmontou bem no centro do acampamento e foi saudado com muito respeito e calorosos Hau-Kolas (Olá, amigo). Convocou-se o Conselho de Chefes e Mão Erguida foi fumar o Cachimbo com os líderes dos Ogalala. Depois que se fumou o Cachimbo, foi trazida a comida e começou-se a partilhar as últimas novidades entre os membros da Tenda da Cura.

Quando a noite caiu, e a última luz enviada pelos raios de amor  do Avô Sol tocaram a grama de Búfalo que cobria os prados, começou a celebração. O nosso Povo sempre apreciou as celebrações. A volta de Mão Erguida a este grupo de Ogalala era um motivo de muita alegria. As expectativas eram enormes e todos os olhos se voltaram para o Contador de Histórias quando ele começou a partilhar as notícias de nascimentos e mortes, dos Golpes que foram Contados, e das decisões dos diversos Conselhos de outras regiões, tomadas durante o último inverno. Após terminar o relatório, Mão Erguida contou uma de suas Histórias de Sabedoria.
- Há muitos invernos - começou ele - no tempo em que ainda havia muitos Búfalos e os únicos inimigos dos Sioux eram os Crow, eu ainda mamava no peito da minha mãe. Eu era muito pequeno, mas observava o acampamento e ouvia os Tambores de meus Ancestrais falando com o Povo. Eu entendia tudo que os Tambores diziam, e ouvia as histórias que eles contavam . Como eu era muito pequeno, as histórias me tranquilizavam sempre que minha mãe estava ocupada tingindo abrigos ou preparando pasta de carne com frutas secas.
- Assim, dez invernos se passaram e eu me tornei um rapaizinho cheio de responsabilidades. Naquela época, meu nome era Ouve os Tambores, porque  a Mulher Xamã que havia  asisitido meu nascimento notou a fascinação que eu tinha  pela batida dos tambores. Perna Torta, meu Pai, havia sido pisoteado por um Búfalo ao salvar a vida de um jovem descuidado que fazia a sua primeira caçada. Assim, eu havia me tornado parcialmente responsável pela caça de pequenos animais para a minha família. Um dia, ao voltar para a casa com um Esquilo e um Coelho, levei-os para a minha mãe e fui saudado pelo Contador de Histórias Cara Amarela. Cara Amarela era um Cabelo trançado que havia servido ao nosso Povo desde o tempo em que meu avô era pequeno.
- Cara Amarela me perguntou o que eu havia aprendido em minha caçada e se eu havia escutado as Criaturas conversando comigo. Fiquei admirado porque eu nunca havia contado a ninguém que seguia as batidas do meu próprio coração, como fossem a música dos Tambores, até o local que os animais me indicavam, dizendo-me quem estava pronto para servir de refeição à minha família.
- Até a hora em que o Avô Sol se punha a Oeste, fiquei ali sentado contando a Cara Amarela as histórias fantásticas que eu havia ouvido de minhas amigas, as Criaturas. Contei-lhe como eu levantava a mão e ordenava a meu coração que tamborilasse Hau-Kola para as Irmãs e os Irmãos da Pradaria. O "alô amigo" que meu coração tamborilava atraía as Criaturas até o local onde eu estava, e eles ficavam felizes em partilhar comigo suas Histórias de Sabedoria. Assim aconteceu que eu fui escolhido  para receber o treinamento do Contador de Histórias Cara Amarela, e acabei tornando-me também um Cabelo Trançado. Meu nome foi mudado para Mão Erguida porque eu costumava saudar todas as criaturas com a mão aberta, levantada em sinal de amizade.

Extraído do Livro: As Cartas do caminho Sagrado, As descobertas do ser através dos ensinamentos dos índios  norte-americanos,  de Jamie Sams



The real Afghan way:


During the war, a photographer was watching some fighters praying. They called to him:
"Come, come pray with us."
"But I am a Buddhist.." the photographer replied;
"It doesn't matter! Come, pray with us."




O mendigo e o baú



Por mais de trinta anos um mendigo ficou sentado no mesmo lugar, debaixo de uma marquise. Até que um dia, uma conversa com um estranho mudou sua vida:
- Tem um trocadinho aí pra mim, moço? - murmurou, estendendo mecanicamente seu velho boné.
-Não, não tenho - disse o estranho. - O que você tem nesse baú debaixo de você?
- Nada, isso aqui é uma caixa velha. Já nem sei há quanto tempo sento em cima dela.
- Nunca olhou o que tem dentro? - perguntou o estranho.
-Não - respondeu. - Para quê? Não tem nada aqui, não!
- Dá uma olhada dentro - insistiu o estranho, antes de ir embora.
O mendigo resolveu abrir a caixa. Teve que fazer força para levantar a tampa e mal conseguiu acreditar ao ver que o velho caixote estava cheio de ouro.


( extraído do livro O poder do Agora)




Como se tornar um homem- ritual de passagem da tribo Cherokee
Publicado em setembro 14, 2010 por Hercoles Jaci
http://hercolesjaci.wordpress.com/

Quando o adolescente estava prestes a se tornar um homem na tribo Cherokee, ele vivenciava um ritual de passagem:

O pai levava o filho para a floresta no final da tarde, vendava-lhe os olhos e deixava-o só. O filho sentava-se sozinho no topo de uma montanha por toda a noite e não podia remover a venda dos olhos até que sentisse na pele os primeiros raios de SOL, ouvindo a natureza em volta saudando a alvorada. Se ele passasse a noite toda lá, seria considerado um homem pelos Cherokees. Ele não poderia contar a experiência vivida para nenhuma outra pessoa, pois a vivência de tornar-se HOMEM é única e esse ritual era sagrado; eles aprendiam isso desde muito pequenos. Enfrentando o desconhecido, a escuridão, o adolescente ficava naturalmente amedrontado. Ele ouvia toda espécie de ruídos que geravam fantasias medonhas. Os animais selvagens poderiam aproximar-se, cobras e insetos poderiam picá-lo; o frio, a fome poderiam chegar; o vento possivelmente soprava assustador, mas ele deveria permanecer consigo mesmo e nunca retirar a venda. Na cultura Cherokee esse era o ritual para ser considerado um HOMEM. Após uma noite terrível, o SOL brilhava e aquecia e a venda poderia ser finalmente removida. O jovem candidato a HOMEM descobria, então, que seu pai esteve ali sentado a poucos metros a noite inteira, protegendo-o de todos os perigos. Nisso ele percebia que um dos fatores que levam os Cherokees a considerar um menino como HOMEM é a confiança, a fé, é saber que a vida é um grande paradoxo, onde nos momentos de maior solidão/solitude, quem nos criou jamais nos abandona. Ser HOMEM é confiar na GUIANÇA. Ser HOMEM também é saber que o SOL nasce no momento mais escuro da madrugada.



Sopa de Piedra







Para quien no se acuerde, ésta es la historia de Nasrudín:

De acuerdo con la historia, Nasrudín llegó a una aldea, llevando nada más que una olla vacía. Al llegar, los aldeanos no querían compartir sus reservas de comida con el hambiento viajero. Nasrudín llenó la olla con agua, tiró una piedra grande y limpia dentro, y la puso al fuego en la plaza mayor de la aldea. Uno de los habitantes sintió curiosidad y le preguntó qué estaba haciendo. Él contestó que estaba preparando una deliciosa "sopa de piedras", aunque le faltaban algunos acompañamientos para poder incrementar el sabor. El aldeano no tuvo inconveniente en prestarles algunos, a cambio de un poco de sopa al final. Otro aldeano pasó por allí, preguntó por la olla, y Nasrudín volvió a mencionar su sopa de piedras, que aún no había alcanzado todo su potencial. El aldeano le dio un poco de condimento a cambio de un plato de sopa. Más y más aldeanos fueron acercándose, añadiendo otros ingredientes. Finalmente todos disfrutaron de una deliciosa y nutritiva olla de sopa.




Nasrudin contrabandista




Volta e meia, Nasrudin atravessava a fronteira entre a Pérsia e a Grécia montado no lombo de um burro. Toda vez passava com dois cestos cheios de palha e voltava sem eles, arrastando-se a pé. Toda vez o guarda procurava por contrabando. Nunca encontrou.
"O que é que você transporta, Nasrudin?"
"Sou contrabandista."
Anos mais tarde, com uma aparência cada vez mais próspera, Nasrudin mudou-se para o Egito. Lá encontrou um daqueles guardas de fronteira.
"Diga-me, Mullá, agora que você está fora da jurisdição grega e persa, instalado por aqui nesta vida boa - o que é que você contrabandeava, que nunca conseguimos pegar?"
"Burros."




Idéia Fixa




Perguntaram a Nasrudin quantos anos ele tem. E a resposta foi:
- Quarenta.
- Como pode ser? Dois anos atrás você já dizia que tinha quarenta anos.
- É que eu sempre sustento o que digo, explicou o Mullá.


Vende-se Metade de uma Casa



Nasrudin dividia a casa em que morava com outra pessoa. Um dia ele decidiu vender a sua metade e procurou um corretor.
– Por que você quer vender só a metade da casa?, perguntou o corretor.
E o Mullá respondeu:
– Porque eu não quero dividir a casa com ninguém. Então acho que a solução é vender a minha parte e, com o dinheiro, comprar a outra metade.







 A Lenda das Areias


Vindo desde as suas origens em distantes montanhas, após passar por inúmeros acidentes de terreno nas regiões campestres, um rio finalmente alcançou as areias do deserto. E do mesmo modo como vencera as outras barreiras, o rio tentou atravessar esta de agora, mas se deu conta de que suas águas mal tocavam a areia nela desapareciam.
Estava convicto, no entanto, de que fazia parte de seu destino cruzar aquele deserto, embora não visse como fazê-lo. Então uma voz misteriosa, saída do próprio deserto arenoso, sussurou:
— O vento cruza o deserto, o mesmo pode fazer o rio.
O rio objetou estar se arremessando contra as areias, sendo assim absorvido, enquanto o vento podia voar, conseguindo dessa maneira atravessar o deserto.
— Arrojando-se com violência como vem fazendo não conseguirá cruzá-lo. Assim desaparecerá ou se transformará num pântano. Deve permitir que o vento o conduza a seu destino.
— Mas como isso pode acontecer?
— Consentindo em ser absorvido pelo vento.
Tal sugestão não era aceitável para o rio. Afinal de contas, ele nunca fora absorvido até então. Não desejava perder a sua individualidade. Uma vez a tendo perdido, como se poderá saber se a recuperaria mais tarde?
— O vento desempenha essa função — disseram as areias. — eleva a água, a conduz sobre o deserto e depois a deixa cair. Caindo em forma de chuva, a água novamente se converte num rio.
— Como posso saber que isto é verdade?
— Pois assim é, e se não acredita, não se tornará outra coisa senão um pântano, e ainda isto levaria muitos e muitos anos; e um pântano não é certamente a mesma coisa que um rio.
— Mas não posso continuar sendo o mesmo rio que sou agora?
— Você não pode, em caso algum, permanecer assim — retrucou a voz. — Sua parte essencial é transportada e forma um rio novamente. Você é chamado assim ainda hoje por não saber qual a sua parte essencial.
Ao ouvir tais palavras, certos ecos começaram a ressoar nos pensamentos mais profundos do rio. Recordou vagamente um estágio em que ele, ou uma parte dele, não sabia qual, fora transportada nos braços do vento. Também se lembrou, ou lhe pareceu assim, de que era isso o que devia fazer, conquanto não fosse a coisa mais natural.
E o rio elevou então seus vapores nos acolhedores braços do vento, que suave e facilmente o conduziu para o alto, e para bem longe, deixando-o cair suavemente tão logo tinham alcançado o topo de uma montanha, milhas e milhas mais distante. E porque tivera suas dúvidas, o rio pode recordar e gravar com mais firmeza em sua mente os detalhes daquela sua experiência. E ponderou: — Sim, agora conheço a minha verdadeira identidade.
O rio estava fazendo seu aprendizado, mas as areias sussurraram:
— Nós temos o conhecimento porque vemos essa operação ocorrer dia após dia, e porque nós, as areias, nos estendemos por todo o caminho que vai desde as margens do rio até a montanha.
E é por isso que se diz que o caminho pelo qual o Rio da Vida tem de seguir em sua travessia está escrito nas Areias.


História publicada em: Histórias dos Dervixes






O jovem que não conhecia o medo.


Certo dia, uma mulher e seu filho tomavam ar fresco ao cair da tarde, sentados no pátio de sua casa. A casa ficava muito distante do povoado, e quando o sol se pôs e a escuridão da noite envolveu tudo em suas sombras, a mulher disse ao jovem:
- Meu filho, vá e feche a porta, pois estou com medo.
- O que é o medo? – Perguntou o rapaz.
- Ora sentir temor – ela respondeu.
Mas a resposta de sua mãe não deixou o jovem satisfeito.
- Não sei o que você quer dizer, mãe. Tenho de experimentar o medo. Vou dar um passeio.
E sem prestar muita atenção aos protestos de sua mãe, adentrou-se na noite, afastando-se da casa. Caminhou até o sopé de uma montanha, onde mais de trinta ladrões se encontravam sentados em volta de uma grande fogueira. O jovem aproximou-se deles e um dos bandidos, que parecia ser o capitão, falou:
- Nem mesmo um pássaro se aventura a voar para esses lados, e nenhuma caravana cruza este caminho. Como você se atreve a aproximar-se de nós?
- Pretendo conhecer o medo. Mostrem-no a mim.
- O medo está aqui, conosco – disse o ladrão.
- Onde? – Perguntou o rapaz.
Então, o ladrão respondeu:
- Pegue este pote, farinha, manteiga e açúcar. Entre nesse cemitério e celebre uma festa com os defuntos.
- Assim farei – respondeu o jovem.
No cemitério acendeu uma fogueira e começou a misturar a farinha, a manteiga e o açúcar. Quando havia terminado, uma enorme mão saiu da terra e fez-se ouvir uma voz:
- Quem é o atrevido?
O rapaz golpeou a mão com sua colher e respondeu:
- Eu que vim celebrar minha festa com os mortos. Volte para onde está teu pé. Agora desapareça!
Ao ouvir esta ofensa, a mão desapareceu e o rapaz, que terminara sua mistura, voltou para perto dos ladrões.
- Então, conheceste o medo? – Perguntaram os ladrões entre risadas.
- Não. Houve apenas uma mão que saiu da terra, pelo visto queria provar a minha sopa; mas levou uma colherada e voltou para o lugar de onde veio.
Os ladrões ficaram assombrados e um deles disse:
- Não muito longe daqui há um casarão abandonado; ali, sem dúvida sentirás medo.
O jovem foi até a casa e entrou; encontrou-se então em um enorme salão completamente vazio e viu, pendurado no teto, um cesto em que havia uma criança chorando. De repente surgiu da escuridão uma jovem, dando voltas nervosamente e olhando com desespero para o cesto pendurado. A donzela aproximou-se do jovem e disse:
- Levanta-me nos seus ombros. A criança está chorando e eu quero niná-lo, mas o cesto está tão alto que assim não o alcançarei.
Ele concordou e a moça se sentou sobre seus ombros. Enquanto balançava a criança, a jovem apertava com os joelhos o pescoço do rapaz. Ele sentiu que ia morrer estrangulado, então deu um salto e a mulher desapareceu, deixando cair no chão um bracelete. O jovem pegou-o e se afastou da casa.
Ao atravessar a rua, um velho judeu que viu o bracelete aproximou-se dele dizendo:
- Este bracelete é meu.
- Não, não é. O bracelete pertence a mim.
O judeu insistiu:
- Ele é minha propriedade.
- Pois vamos até o juiz. Se ele disser que é seu lhe darei. Senão ficarei com ele.
Quando expuseram o caso ao juiz, este setenciou:
- O bracelete será daquele que prove ser seu dono.
Nenhum dos dois pôde fazê-lo, e o juiz guardou a jóia até que comprovassem a quem pertencia.
O rapaz não se esquecera de que havia saído em busca do medo, e que nada do que havia acontecido o fizera senti-lo. Depois de muito caminhar, chegou a uma praia onde viu um barco que naufragava, e gritou:
- Vocês tem medo de se afogar?
E uma voz lhe respondeu:
- Claro que temos medo, como não iriamos ter medo, se estamos a ponto de morrer?
Rapidamente, ele tirou suas roupas e, atirando-se ao mar, nadou até chegar a embarcação.
Outra voz lhe disse:
- Estamos naufragando, como podes perguntar se temos medo?
O jovem amarrou um cabo na cintura e descendeu até às profundezas do oceano. Ali descobriu que a filha do mar estava puxando o barco. Amarrou-a com o cabo e trouxe-a para fora d’água. Chegando à superfície, perguntou-lhe em tom desafiante:
- É isto o medo?
E soltou-a,virando as costas e afastando-se de novo em busca do medo.
Caminhou pela costa e descobriu um grande jardim em frente ao qual havia uma fonte. Três pombos que saltitavam ao seu redor submergiram n’água e ao voltar a sair se converteram em três donzelas que traziam uma mesa com taças para beber. Quando uma delas se dispôs a brindar, as outras duas lhe perguntaram:
À saúde de quem bebes?
Ela respondeu:
- Bebo a saúde daquele que celebrou sua festa entre os defuntos e não desmaiou quando saiu uma mão da terra.
Quando a segunda ia beber, as outras perguntaram o mesmo, e ela respondeu:
- À saúde daquele que não teve  medo de morrer estrangulado.
Por último, a terceira levantou sua taça e respondeu à pergunta das outras:
- No mar naufragava um barco; um jovem aprisionou a donzela que era culpada e não tremeu. À sua saúde bebo.
O rapaz resolveu falar:
- Eu sou esse jovem.
As donzelas o abraçaram e ele continuou:
- O juiz conserva o bracelete que caiu do braço de uma de vocês. Um velho judeu quis tirá-lo de mim, mas não permiti.
As jovens pegaram sua mão e desceram com ele a uma cova onde havia vários pátios, e em cada pátio uma infinidade de jóias dentro de caixas. Uma das donzelas disse:
- Tome este outro bracelete. Como é igual ao que está com o juiz, podes comprovar que os dois são teus.
Assim fez o rapaz e voltou com os dois braceletes à caverna.
- Não saias nunca do nosso lado! – disseram as donzelas.
- Sinto muito, mas não posso ficar enquanto não saiba o que é o medo.
E despedindo-se delas, seguiu seu caminho.
Logo chegou a um lugar onde se aglomerava uma multidão.
- O que está acontecendo? – perguntou o jovem.
Responderam-lhe que como havia morrido o rei daquele país, iam escolher um sucessor. Para a eleição, soltariam uma pomba que pousaria sobre a cabeça daquele designado pelos céus.
E quando soltaram a pomba, esta foi pousar na cabeça do jovem que não conhecia o medo. Como ele não se considerava digno de aceitar tal honra, soltaram uma nova pomba que, como na vez anterior, pousou na cabeça do jovem. Então o povo começou a gritar: “Você é nosso rei!”.
- Mas se estou em busca do medo! Não posso ser rei! – dizia enquanto era arrastado pela multidão para o palácio.
Finalmente, da janela da sala do trono disse a multidão:
- Aceito ser rei por esta noite, mas amanhã partirei em busca do medo.
Atravessando os aposentos do palácio, chegou a uma sala onde viu alguns homens construindo uma caixão e esquentando água.
Quando terminaram seu trabalho, ele resolveu que dormiria naquele aposento. Encostou o caixão na parede, apagou o fogo com água e começou a dormir.
Quando, de manhã, os homens entraram esperando encontrar o novo rei morto e viram que gozava de perfeita saúde, foram contá-lo a sua sultana, que lhes disse:
- Quando chegar a noite e estiver jantando comigo, coloquem um pardal vivo dentro da sopeira.
Enquanto jantavam, a sultana disse ao rei:
- Levante a tampa da sopeira.
- Não, porque não quero sopa – respondeu.
- Mas eu quero, faça-me este favor.
Tão logo o jovem levantou a tampa, o pássaro saiu voando. Foi tão inesperado o incidente que o rapaz sentiu um fugaz calafrio.
-Viu isto que você acaba de sentir? – disse a sultana. – Pois isso é o medo.
- É só isso? – Perguntou o jovem.
- Você agora já tremeu uma vez, que era o que buscava conseguir; o tremor será maior ou menor, mas já poderá conhecê-lo se voltar a senti-lo – respondeu ela.
Durante quarenta dias, celebrou-se o casamento entre a sultana e o jovem, e este governou com justiça durante muitos anos.



Pode ser sorte ou azar   - Parábola Chinesa

Era uma vez um menino chinês pobre que estava triste sentado na calçada no lado de fora de sua casa.
O maior sonho dele era ter um cavalo, mas não tinha dinheiro. Nesse dia passou uma cavalaria, sabendo que esse era o maior desejo do menino, perguntaram -lhe se ele queria um cavalinho. Sorrindo de felicidade, o menino aceitou.
Ao saber disso, um vizinho veio correndo ao pai do menino e disse:
- Isso que é sorte ! Ele queria um potrinho e veio uma pessoa e atendeu ao desejo do menino !
O pai olhou para o vizinho e disse:
Pode ser Sorte ou Azar.
O menino cuidava do cavalo com carinho enquanto crescia, mas um dia, quando já estava crescido, o cavalo fugiu. Dessa vez, o vizinho disse ao pai:
seu filho deu o maior azar ! Cuida do cavalo desde pequeno e quando ele cresce, foge. 
O pai disse a mesma coisa: Pode ser Sorte ou Azar.
O tempo passou e um dia o cavalo voltou liderando uma manada selvagem. O menino, que já era moço, conseguiu cercar todos os cavalos e ficar com eles.
O vizinho fofoqueiro voltou a falar:
Seu filho é que tem sorte ! Cria um potrinho que foge e volta com uma manada de brinde ! O pai olhou para o vizinho e disse novamente: Pode ser Sorte ou Azar.
Mais tarde, o rapaz estava treinando um dos cavalos quando cai e quebra a perna. O vizinho que estava perto, disse ao pai:
- Isso que é azar ! O cavalo foge, volta com uma manada, e depois de um tempo feliz, fica treinando os animais e quebra a perna ! O pai, com a mesma tranquilidade de sempre, disse : Pode ser Sorte ou Azar.
Dias depois, o reino onde moravam declara guerra ao reino vizinho. Todos os jovens são convocados, menos o moço que está com a perna quebrada. 
O vizinho, desesperado com a convocação de seu filho, chora as mágoas com o pai do garoto do cavalo:
- Seu filho sim é que tem sorte ! Bendita hora para quebrar a perna. O pai, olha para o vizinho fixamente e diz:
Pode ser Sorte ou Azar....

Nasrudín y el viajero

Nasrudín es un joven tonto que la madre manda al mercado a vender una pieza de paño que ha tejido. Andando por el camino a la ciudad Nasrudín encuentra otro viajero con el que comienza enseguida a conversar. Las palabras del joven son tan poco realistas que el otro se da cuenta enseguida de poder engañarlo.
   "Dame esa tela, tu no la necesitas", le dice. Nasrudín, que se cree inteligente, responde:
   "¡Un momento, amigo! Mi madre me ha dicho de venderla por que necesita el dinero. Somos pobres ¿sabes? No sería un acto responsable regalarla".
   "Muy bien -dijo el hombre- Te daré veinte monedas de plata, pero como nos las tengo aquí con migo ahora, te las daré la próxima vez que nos veamos" ¡Veinte monedas de plata! Esto le parece a Nasrudín una gran oportunidad pues su madre le ha dicho que podrían obtenerse, a lo sumo, tres monedas de plata.
   "Entonces la puedes tener -responde Nasrudín, agregando con mucha astucia- aunque estoy perdiendo dinero", cosa que ha sentido decir a los mercaderes cuando concluyen un negocio.
 "Bien, me voy" -dice el hombre.
   "¡Alto ahí!" responde Nasrudín, dado que le ha venido en mente otra idea "Debo saber tu nombre para poder reencontrarte"
   "Es fácil -dice el otro- Yo soy Yo, ahora ya sabes quien soy".
   Nasrudín, satisfecho de su trabajo, se vuelve a la casa a contarle a la madre lo que le ha ocurrido.
   "Todo lo que tengo que hacer es encontrar a "Yo" y hacerme pagar"
   "¡Qué tonto! -exclama la madre- ¡Todos se llaman "yo"! Tu eres "yo" para ti mismo, Yo soy "yo" para mi misma, y también aquel hombre es "yo".
   "Esto es demasiado complicado para mi -responde Nasrudín- Pero mañana iré a buscar a "Yo" y me pagará".
   Al día siguiente, Nasrudín parte para el mercado, y a mitad de camino se encuentra un hombre sentado a la sombra de un árbol. Nasrudín, que además era obtuso, no recuerda el aspecto del hombre que se había llevado su tela.
   "Este hombre -piensa- podría ser él" y decide asegurarse. "¿Quién eres?" le pregunta al hombre.
   Al otro no le cae bien un encuentro tan directo y le hace señas de que se vaya: "No te importa. ¡Fuera, fuera!".
   Nasrudín, que ha sido educado por su madre, considera que siempre se deba responder cortésmente a una pregunta. El hombre se estaba comportando mal. Así que Nasrudín levantó una gran piedra y, sosteniéndola sobra la cabeza del viajero le pregunta: "¿Quien eres? Creo que tu eres Yo".
   "Está bien -responde el hombre poniéndose nervioso- si eso te place, yo soy Yo".
   "Es lo que pensaba. Ahora, dame las veinte monedas de plata"
   Convencido de que Nasrudín sea un peligroso lunático, el hombre le arroja presuroso las monedas y escapa contento de haber salvado la vida.


A Viagem do Príncipe Átila ao Fim do Mundo

Era uma vez um rei que tinha um filho chamado Átila. Um dia o rei chamou os sábios de seu reino e lhes disse:
— Como posso por meu filho à prova para saber se é realmente valente e digno de suceder-me como rei?
— Mande-o procurar o jardim mágico onde crescem as maçãs da vida – disse um dos conselheiros. – que traga uma para Vossa Majestade.
— Mande-o buscar o anel da verdadeira felicidade – disse outro.
O terceiro disse:
— O príncipe deve trazer o espelho da verdade do palácio do rei Mendoza, que vive no Reino do Fim do Mundo.
O rei despediu seus cortesãos e mandou chamar o filho. Quando Átila se apresentou diante dele, disse-lhe:
— Meu filho, a fim de provar seu valor, quero que saia pelo mundo e me traga um... uma maçã do jardim da vida, o anel da verdadeira felicidade e o espelho da verdade do reino do Fim do Mundo.
O príncipe imediatamente concordou em ir buscar essas coisas maravilhosas, e o rei deu uma grande festa para comemorar a partida do filho.
Naquela noite o príncipe estava agitado em seu leito, perguntando-se como faria para realizar tão estranha viagem, quando uma luz brilhante surgiu num canto de seu quarto e lá, no meio da luz, viu uma forma reluzente e fantástica.
— Não tenha medo de mim – disse a cintilante e formosa criatura. – Sou a sua fada protetora e estou aqui para ajudá-lo. Seu pai lhe impôs três tarefas.
Átila ergueu-se no leito e arregalou os olhos, mudo de assombro.
— Essas tarefas não são tão difíceis como imagina – continuou a fada. – Durma bem esta noite e amanhã, quando partir, eu protegerei você.
A fada sorriu, apanhou uma corrente com um talismã e disse:
— Ponha isto no seu pescoço, Átila. Quando precisar de mim, esfregue-o três vezes.
Antes que Átila pudesse agradecer, a fada desapareceu.
Na manhã seguinte o príncipe montou seu cavalo no pátio e saiu do castelo. Estava muito excitado, já que nunca tinha saído do reino de seu pai e tinha todo o mundo pela frente.
Cavalgou, cavalgou, e a fada sempre aparecia toda vez que ele precisava saber que caminho seguir. Durante três dias cavalgou, dormindo junto a seu cavalo quando a noite chegava.
Por fim chegou a um país desconhecido e viu num vale um jardim cercado de muralhas. Galopou até chegar a uma pesada porta, que se abriu quando a tocou. Amarrou as rédeas do cavalo na porta e vagou pelo pomar, onde as macieiras exibiam seus ramos carregados de frutos. Olhou ao redor e, nesse instante, a voz da fada protetora chegou novamente ao seu ouvido:
— Apanhe uma das maçãs, este é o jardim mágico onde crescem as maçãs da vida.
Átila estendeu a mão e apanhou uma maçã vermelha e brilhante. Nesse momento um grande número de criaturas voadoras zumbiu ao seu redor, picando-o furiosamente nas mãos, no rosto e no pescoço. Ele esfregou o talismã e gritou:
— Socorro! Socorro!
No mesmo instante todas as criaturas desapareceram e as picadas deixaram de doer. Montou rapidamente no cavalo. Cavalgou, cavalgou até deixar bem longe o jardim mágico. Só então suspirou aliviado. Havia passado pela prova e a maçã estava em seu bolso.
Agora cavalgava pela paisagem mais bonita que pudesse ter imaginado, com botões em flor por toda parte e um riacho de prata correndo entre margens cobertas de musgo. Apeou num salto e foi beber no riacho, onde o cavalo também saciou a sua sede. O cavalo começou a mordiscar um delicioso pasto verde, e o príncipe começou a sentir muita fome. Três lindas jovens chegaram com cestos de roupa lavada e estenderam-na sobre os arbustos para secar. Quando viram o príncipe deixaram tudo de lado e se aproximaram dele.
— Poderiam dizer-me onde posso encontrar alojamento para passar a noite? – perguntou o príncipe Átila. – Meu cavalo e eu estamos muito cansados.
A moça mais jovem o levou colina acima e mostrou-lhe uma granja onde poderia ficar por algum tempo.
Naquela noite, enquanto o granjeiro e sua mulher estavam sentados à mesa com o príncipe, ouviram bater à porta.
— Quem poderá ser a esta hora da noite? – disse o granjeiro, e foi atender a porta, onde estava um velho mendigo encharcado pela chuva.
— Entre, vovô, entre rápido e aqueça-se ao fogo – falou o granjeiro, e sua esposa lhe deu uma xícara de caldo.
Envolveram o velho num cobertor quente, e quando os outros foram para cama ele se deitou junto ao fogo.
O príncipe Átila estava em um pequeno quarto que dava para a cozinha, mas no meio da noite foi despertado pelo som de alguém se queixando. Levantou-se e foi até a cozinha, onde viu o velho estendido, muito doente. Outra vez a voz da fada protetora sussurrou-lhe ao ouvido:
— A maçã da vida, dê-lhe a maçã da vida.
Átila tirou do bolso a preciosa maçã e deu ao ancião um pedacinho, e depois outro. Quando terminou de comer a maçã o velho mendigo parou de queixar-se e, subitamente, ocorreram mudanças maravilhosas. Seus olhos se tornaram brilhantes, seu cabelo ficou negro, seus membros se tornaram fortes, e em dez minutos ele se levantou com um aspecto cinqüenta anos mais jovem.
— Obrigado, príncipe Átila – disse. – Em troca de sua bondade eu lhe darei algo: aqui está o anel da verdadeira felicidade, que sei que está procurando.
Átila viu que tinha na mão um anel de ouro com uma pedra de opala de estranho brilho.
— Como sabe quem sou? – perguntou Átila. – Você é um mago?
— Não. Fui mandado aqui por sua fada protetora para trazer-lhe este anel, que foi meu durante muitos anos. Agora, como você me deu a maçã da vida, poderei continuar minha busca, que é secreta, por mais cinqüenta anos.
Na manhã seguinte, quando o príncipe acordou, o viajante já havia partido. O granjeiro e sua mulher procuraram convencer o jovem a ficar mais tempo com eles, mas Átila decidiu partir para o Reino do Fim do Mundo. Deu-lhes uma peça de ouro, agradeceu-lhes e se afastou em seu cavalo. Deixou que o cavalo o levasse cada vez mais longe, até que chegaram a um lugar totalmente desolado, com montanhas até onde a vista alcançava. À noite encontraram abrigo numa grande caverna, e na escuridão do interior a fada protetora apareceu ao príncipe.
— Você não está longe do Fim do Mundo, Átila. Amanhã você atravessará a montanha e chegará ao palácio do Rei Mendoza. Eu o ajudarei a conseguir dele o espelho da verdade e depois o ajudarei a voltar ao seu país.
Dizendo isto a fada desapareceu.
Na manhã seguinte, quando o príncipe acordou, o sol brilhava alto no céu. O cavalo, com valentia, levou-o através de um estreito caminho, com rochas tão grandes dos dois lados que pareciam torres. À distância, Átila viu um gigantesco castelo suspenso no alto da montanha, bem no fim do mundo. Nele havia cem torres, e em cada uma brilhava uma estrela dourada. O caminho até o castelo era difícil, mas Átila conduziu sua montaria com cuidado por toda a extensão da trilha, e eis que diante deles apareceram as portas douradas do castelo do Rei Mendoza.
— Que deseja? – perguntou o capitão da guarda quando o príncipe bateu a aldrava em forma de cabeça de leão.
— Vim ver o Rei Mendoza – disse Átila corajosamente.
O principal conselheiro do rei chegou para levá-lo á presença do soberano, porque o rei minutos antes tinha visto a chegada de Átila no espelho da verdade.
O rei Mendoza estava sentado em seu trono de marfim lavrado, mas não parecia feliz. Disse a Átila:
— Vivo neste castelo dourado e tenho o quarto do tesouro cheio de jóias, meus estábulos estão cheios de cavalos magníficos e meus domínios são os mais ricos da Terra. Mas não conheço a paz de espírito. Por quê?
— Majestade – disse Átila, tirando o anel da verdadeira felicidade. – Use isto e terá o que não tem.
Mal o anel tocou o dedo do rei Mendoza, o monarca sentiu a felicidade em cada veia do seu corpo e em cada fio de cabelo de sua cabeça. Saltou do trono e exclamou:
— Você terá o que quiser, qualquer coisa que diga e que esteja em meu reino, porque agora sou o homem mais feliz do mundo!
— Poderia dar-me o espelho da verdade? – perguntou Átila.
O rei respondeu imediatamente:
— De todo o coração!
Átila permaneceu por algum tempo no Reino do Fim do Mundo e foi homenageado por sete dias e sete noites.
Finalmente partiu rumo ao seu lar, levando o espelho da verdade em seu alforje.
Viajou durante muitos dias pelo longo caminho de regresso, até que se aproximou de casa. Há poucas milhas do palácio viu um enorme dragão e notou que a fera tinha uma jovem entre as fauces. Átila esfregou três vezes o talismã e, firmando-se nos estribos com a espada desembainhada, atirou-se contra o monstro, gritando com todas as suas forças. Logo, com um poderoso golpe, matou o dragão. A jovem que salvou era filha de um carvoeiro e lhe agradeceu de todo coração.
Venha – disse o príncipe. – suba no meu cavalo e a levarei para casa.
Átila nunca tinha visto uma jovem tão bela e lhe pediu que se tornasse sua esposa.
Assim cavalgaram alegremente até o palácio. Mas todas as casas estavam fechadas e as lojas também. Ninguém veio saudar o príncipe que regressava ao lar. As portas do palácio também estavam hermeticamente fechadas, e por mais que príncipe as golpeasse com todas as forças permaneceram sem abrir-se. Tirou então de seu alforje o espelho da verdade, olhou nele e viu que toas as pessoas da cidade estavam assustadas com a grande fera que acabara de matar.
Gritou então, enquanto brandia a espada:
— Saiam! Saiam de suas casas e lojas e abram o palácio. O dragão está morto! Matei o dragão!
Imediatamente o povo saiu correndo de suas casas e lojas, todos se alegraram em vê-lo de volta e o levaram para o palácio. A filha do carvoeiro se perdeu no meio da multidão, mas o príncipe logo a encontrou e a levou à presença de seu pai. O rei estava muito feliz por tornar a vê-lo, felicitou-o por sua formosa noiva e disse:
— Que aconteceu com a maçã da vida, o anel da verdadeira felicidade e o espelho da verdade?
Átila então contou toda a história, do princípio ao fim, sem omitir um só detalhe, e lhe deu o espelho da verdade.
— Querido, filho – disse o rei, — você me trouxe o melhor que um ser humano possa ter, mesmo sendo um rei. Porque sem a verdade o que é a felicidade? O que é a vida?

História publicada em: Histórias da Tradiçao Sufi